E havia em Antioquia, na igreja que estava ali, alguns profetas e mestres: Barnabé e Simeão, chamado Níger, e Lúcio cireneu, e Manaém, que tinha sido criado na infância junto com Herodes o Tetrarca, e Saulo.
Comentário de David Brown
A palavra “alguns” (presente em algumas versões) é, por razão válida, excluída do texto por Lachmann e Tischendorf, pois é, no mínimo, desnecessária.
A palavra que traduzimos como ‘criado na infância junto’ [suntrofos], embora às vezes usada no sentido amplo de ‘companheiro na juventude’, geralmente significa ‘criado ao mesmo peito’, e os melhores críticos entendem que é o caso aqui.
Esses cinco nomes merecem atenção. Barnabé é citado primeiro, sem dúvida por ocupar o lugar principal na igreja de Antioquia naquele momento, enquanto Saulo — por ter chegado por último nesse lugar, e possivelmente também por ser o mais jovem dos cinco — é o último nomeado. Dos três nomes intermediários, temos informações suficientes para identificá-los com relativa certeza.
Começando pelo do meio — “Lúcio”, provavelmente o mesmo para quem Paulo envia uma saudação em sua Epístola aos Romanos (Romanos 16:21), aqui chamado de “o Cireneu”, como se, por esse nome, ele fosse imediatamente reconhecido — esse homem deve ter sido um dos “chipriotas e cireneus” que levaram o Evangelho a Antioquia pela primeira vez (Atos 11:20). Embora fosse apenas um simples “discípulo”, quando a perseguição o expulsou de Jerusalém, ele demonstrou, ao se associar com Barnabé e Saulo no cuidado da igreja em Antioquia, capacidade para funções mais elevadas no ministério cristão, e, após “adquirir para si uma boa reputação,” foi finalmente agraciado do alto com o dom profético.
Passando para “Simeão” (de quem nada sabemos além do que é mencionado aqui), se ele foi chamado “Níger” por seu tom de pele mais escuro, podemos concluir que ele também era do sul, uma daquelas regiões quentes, e talvez um dos que primeiro levaram o Evangelho a Antioquia?
Em relação ao último nome, “Manaém”, o mesmo de um dos reis de Israel (2Reis 15:14), um fato singular é acrescentado. É surpreendente encontrar entre os profetas e mestres da igreja cristã de Antioquia o ‘irmão de criação’ de um personagem tão licencioso e cruel quanto Herodes, o tetrarca. Mas isso seria mais surpreendente do que encontrar entre as mulheres abençoadas que acompanharam Jesus em uma de suas viagens de pregação pela Galileia e O serviram com seus bens, “Joana, esposa de Cuza, o procurador de Herodes”? (Veja as notas em Lucas 8:1-3). Se Manaém foi atraído para Pereia após a ascensão de seu irmão de criação ao poder, ele pode ter ouvido o Evangelho da própria boca de Cristo durante uma estadia de Jesus por lá, ou de um de Seus discípulos. E se ele foi a Jerusalém entre as multidões que lá se reuniam no Pentecostes e foi um dos milhares de convertidos nos primeiros dias do Evangelho, permanecendo com eles até ser expulso pela perseguição, pode muito bem ter se juntado ao pequeno grupo que foi para Antioquia, ao invés de qualquer outro lugar, e pode ter sido honrado, junto com eles, a plantar o estandarte da Cruz ali.
Se for o caso, então, nos cinco homens nomeados aqui, temos justamente os fundadores da igreja em Antioquia (ao menos três deles), com Barnabé, a quem todos respeitariam, e Saulo, que em breve até o ofuscaria. Como esses dois irmãos de criação se tornaram diferentes: um, entregue a uma vida licenciosa e manchada com o sangue dos mais ilustres profetas de Deus, embora não sem momentos de reforma e remorso; o outro, um discípulo devoto do Senhor Jesus e profeta da Igreja em Antioquia! Mas isso é apenas o que pode ser visto em todas as eras: “Assim é, Pai, pois assim foi do teu agrado.”
Com respeito aos dois ofícios aqui mencionados, os “profetas” do Novo Testamento, como vimos (em Atos 11:27), não necessariamente previam eventos futuros, embora muitas vezes o fizessem. Eles eram simplesmente pessoas inspiradas, revelando imediatamente, pelo Espírito, a mente do grande Cabeça da Igreja. Por isso, nas listas dos ofícios do Novo Testamento, eles vêm sempre logo após os apóstolos, como aqueles que, junto com eles, orientavam a Igreja Cristã — “Primeiro, apóstolos; em segundo lugar, profetas” (1Coríntios 12:28); “Edificados sobre o fundamento dos apóstolos e profetas” (Efésios 2:20); “E ele deu uns para apóstolos, e outros para profetas” (Efésios 4:11). Compare também com Apocalipse 18:20. (O leitor deve ter cuidado para não confundir os “profetas” nessas passagens com os do Antigo Testamento, aos quais não há referência aqui).
Os “mestres”, como o nome indica, dedicavam-se ao segundo grande departamento do ministério cristão — “ensinando-os” (como Cristo estabeleceu no Monte das Oliveiras pouco antes de sua ascensão) “a observar todas as coisas que eu vos ordenei” (Mateus 28:20). Enquanto os profetas parecem ter atuado também como mestres, não parece que os mestres fossem necessariamente profetas. Para qual desses dois ofícios os cinco mencionados aqui devem ser atribuídos, não podemos ter certeza; mas, se, como dificilmente duvidamos, Barnabé e Saulo foram os notáveis “mestres”, podemos presumir que os outros três, enquanto atuavam como seus assistentes no ensino, também tinham o dom profético — uma suposição confirmada pelo fato de que o chamado profético seguinte — “Separai-me Barnabé e Saulo” — deve ter vindo de outros, além deles mesmos; e, se assim for, certamente de um dos três restantes.
Agora chegamos ao memorável incidente que deu início ao movimento mais importante da Igreja Cristã, depois de sua formação inicial no Dia de Pentecostes. [Jamieson; Fausset; Brown, 1866]
<Todas as Escrituras em português citadas são da Bíblia Livre (BLIVRE), Copyright © Diego Santos, Mario Sérgio, e Marco Teles, com adaptação de Luan Lessa – janeiro de 2021.