Um novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros; tal como eu vos amei, também ameis vós uns aos outros.
Comentário de Brooke Westcott
34, 35. O anúncio da separação iminente leva à explicação de seu propósito. O tempo de ausência de Cristo deveria ser um período de crescimento espiritual. Para isso, Ele deu um mandamento que guiaria os discípulos a assimilar as lições de Sua vida. Dessa forma, ao viverem de acordo com esse ensinamento, eles O seguiriam e O encontrariam. Ao dar esse mandamento, Jesus fala tanto como Mestre quanto como Pai (v. 33, “filhinhos”), instruindo os membros de Sua casa antes de Sua partida.
Um novo mandamento… que vos ameis uns aos outros – A última parte da frase geralmente é entendida como o conteúdo ou o propósito do mandamento. Neste caso, a “novidade” do mandamento (que já existia na letra, Levítico 19:18; Lucas 10:27) deve ser encontrada na novidade do motivo e do alcance. O exemplo do sacrifício de Cristo, iniciado na Encarnação e consumado em Sua morte, revelou novas obrigações e novas capacidades ao ser humano (1 João 2:7-8). O conceito de “próximo” foi finalmente entendido como qualquer ser humano (Lucas 10:36), enquanto esse amor universal se baseava em um amor especial dentro da comunidade cristã (ἀλλήλους, “uns aos outros”). Assim, Cristo foi reconhecido primeiro como a vida da Igreja e, depois, como a vida da humanidade. Dessa forma, a compreensão plena de Sua Pessoa foi sendo revelada gradualmente, à medida que o senso de “fraternidade” se cumpria n’Ele, e o amor se tornava uma força interior ativa, e não apenas uma obrigação. O autossacrifício passou a se basear em um princípio universal, e não em demandas relativas. Nada no contexto sugere que a intensidade do mandamento foi aumentada, como se agora os homens devessem amar o próximo mais do que a si mesmos.
No entanto, há quem sugira que o “novo mandamento” se refira à ordenança da Santa Ceia, que foi instituída para que os cristãos “se amassem uns aos outros”, ao lembrar o ato supremo do amor de Cristo. Se for assim, as palavras “que vos ameis uns aos outros” expressariam o propósito e não o conteúdo do mandamento. Entretanto, é difícil supor que uma instituição como essa fosse chamada de “mandamento” (ἐντολή, 1 João 2:7; 3:22 e seguintes). Mas mesmo que essa interpretação não seja aceita, o uso da partícula final (ἵνα ἀγαπᾶτε) parece indicar o alcance do mandamento, e não apenas a sua forma.
A força do “novo mandamento” é ilustrada pela famosa resposta de Hillel: “O que é odioso para ti, não faças ao teu próximo (companheiro, לחברך). Isso é toda a Lei: o resto é apenas comentário” (Buxtorf, ‘Lex.’ s. v. מני). O positivo e o absoluto substituem o negativo e o relativo.
“Mandatum novum do vobis, ut vos invicem diligatis: non sicut se diligunt qui corrumpunt, nec sicut se diligunt homines quoniam homines sunt; sed sicut se diligunt quoniam dii sunt et filii Altissimi omnes, ut sint Filio eius unico fratres …” (Agostinho, ad loc.).
Mandamento: Este único mandamento inclui o resumo da antiga Lei. Compare com Romanos 13:10. Ele é universal em seu alcance e também em sua aplicação. Ele pertence à vida comum. A transição do plural para o singular em 1 João 2:3 e 2:7 deve ser observada.
Assim como eu vos amei: Esta cláusula também é ambígua. Pode expressar tanto o caráter quanto a razão do amor dos cristãos. No primeiro caso, supõe-se que essa cláusula seja transposta e colocada na frente para ênfase: “para que também vós vos ameis uns aos outros assim como eu vos amei”, isto é, com devoção absoluta. No entanto, tal transposição é estranha ao estilo de São João, e nesta interpretação, “vós” também perde sua força. Assim, parece melhor entender a cláusula como paralela a “um novo mandamento vos dou”. O mandamento é, portanto, reforçado pelo exemplo: “Eu ordeno o preceito (ou eu estabeleço a norma), assim como até este último momento eu vos amei, para que também vós, inspirados por mim, imitem o meu amor uns para com os outros.” Compare com 1 João 3:16.
Eu vos amei: A forma exata (ἠγάπησα, eu amei) implica que a obra de Cristo agora está idealmente concluída. Compare com 15:9, 15:12, 17:4. [Westcott, aguardando revisão]
<Todas as Escrituras em português citadas são da Bíblia Livre (BLIVRE), Copyright © Diego Santos, Mario Sérgio, e Marco Teles, com adaptação de Luan Lessa – janeiro de 2021.