Paz na Bíblia (shalom ↗ no hebraico; eirene ↗ no grego) engloba três ideias principais: (1) bem‑estar exterior e interior: no Antigo Testamento, pode dizer respeito à prosperidade nacional, saúde física e tranquilidade da alma, além de ser saudação comum, (2) reconciliação com Deus em Cristo: no Novo Testamento, é fruto da obra de Jesus, saudação apostólica e chamado à vida cristã, e (3) silêncio e cessar de contendas: em vários contextos, significa também ficar quieto ou calar‑se diante de Deus. Continue lendo o artigo para entender cada uma dessas perspectivas.
Paz no Antigo Testamento
É condição de liberdade de perturbações, seja externamente – como uma nação livre de guerra ou inimigos – seja internamente, na própria alma. A palavra hebraica é shalom (tanto adjetivo como substantivo), significando primariamente “integridade”, “saúde”, mas passando também a denotar “prosperidade”, bem-estar em geral, todo o bem relativo ao homem e a Deus. Em tempos antigos, para um povo assediado por adversários, a paz era a bênção primordial. Em Salmo 122:7, temos “paz” e “prosperidade”, e em Salmo 35:27; 73:3, shalom é traduzido como “prosperidade”.
(1) Shalom era a saudação comum, usada para indagar pela saúde de alguém e também em despedidas (Gênesis 29:6, “Está bem com ele?” – literalmente “Há paz para ele?”; 43:23, “Paz seja convosco”; 43:27, “Ele lhes perguntou pelo bem-estar [pela paz] deles”; Juízes 6:23, “O SENHOR lhe disse: Paz seja contigo”; 18:15, “lhe perguntou pelo seu bem-estar”; 19:20, etc.).
(2) A paz em relação aos inimigos (implicando prosperidade) era o grande desejo da nação e era dom de Deus ao povo, caso andasse em Seus caminhos (Levítico 26:6; Números 6:26, “O SENHOR levante sobre ti o seu rosto e te dê paz”; Salmo 29:11; Isaías 26:12, etc.). “Morrer em paz” era muito desejável (Gênesis 15:15; 1Reis 2:6; 2Crônicas 34:28).
(3) A paz interior era a porção dos justos que confiavam em Deus (Jó 22:21, “viva em paz com ele e assim lhe sobrevirá o bem”; Salmo 4:8; 85:8, “Falará paz ao seu povo e aos seus santos”; 119:165; Provérbios 3:2; 3:17; Isaías 26:3, “Conservarás em perfeita paz aquele cujo pensamento em ti persevera”; Malaquias 2:5); assim como paz externa (Jó 5:23–24; Provérbios 16:7, etc.).
(4) A paz devia ser buscada pelos justos (Salmo 34:14, “Busca a paz e segue-a”; Zacarias 8:16; 8:19, “Ama a verdade e a paz”).
(5) A paz seria aspecto proeminente dos tempos messiânicos (Isaías 2:4; 9:6, “Príncipe da Paz”; 11:6; Ezequiel 34:25; Miquéias 4:2-4; Zacarias 9:10).
Paz no Novo Testamento
(1) O evangelho em Cristo é mensagem de paz de Deus para os homens (Lucas 2:14; Atos 10:36, “pregando paz por meio de Jesus Cristo”). É “justificados mediante a fé, temos paz com Deus por nosso Senhor Jesus Cristo” (Romanos 5:1); paz entre judeus e gentios (Efésios 2:14-15); elemento essencial do reino espiritual de Deus (Romanos 14:17).
(2) Deve ser valorizada e seguida pelos cristãos. Jesus exortou Seus discípulos: “Tende sal em vós mesmos e paz uns com os outros” (Marcos 9:50); Paulo manda: “Vivei em paz; e o Deus de amor e de paz estará convosco” (2Coríntios 13:11; compare Romanos 12:18; 1Coríntios 7:15).
(3) Deus é chamado com frequência “o Deus de paz”, Autor e Doador de todo bem (“paz” incluindo toda bênção) (Romanos 15:33; 16:20; 2Tessalonicenses 3:16, “o Senhor da paz”). “Graça a vós e paz da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo” é saudação apostólica comum (1Coríntios 1:3; 2Coríntios 1:2).
(4) Também usamos “paz” como saudação (Mateus 10:13; Lucas 10:5); “filho de paz” (Lucas 10:6) é quem a merece; a saudação do Senhor foi “Paz seja convosco” (Lucas 24:36; João 20:19, 21, 26); e Ele deixou-lhes novamente a bênção de “Paz” (João 14:27); frequentemente encontramos “Ide em paz” (Marcos 5:34; Lucas 7:50). Em Lucas 19:38 há a aclamação “Paz nos céus”.
(5) A paz que Cristo trouxe é, antes de tudo, uma paz espiritual que vem de Deus e nos reconcilia com Ele — uma paz no coração. Ele disse que não veio “trazer paz à terra, mas espada”, referindo-se ao caráter penetrante de Seu chamado e às divisões e separações que isso provocaria. No entanto, o espírito do evangelho e do cristão é de paz, e é dever do cristão buscar o fim das guerras e contendas em todos os lugares. Isso é apresentado como o resultado final do evangelho e do Espírito de Cristo: a paz universal e permanente só será possível quando esse Espírito reinar no coração dos homens.
Paz como silêncio
No Antigo Testamento, “paz” no sentido de silêncio traduz charash (“ficar quieto ou calar-se”) (Gênesis 24:21; 34:5; Jó 11:3), chashah (“calar-se”, “ficar silencioso”) (2 Reis 2:3, 5; Salmo 39:2), e outras palavras. Em Jó 29:10 (“os nobres se calaram”), traduz qol (“voz”).
No Novo Testamento encontramos siopaô (“calar-se”) (Mateus 20:31; 26:63; Atos 18:9), sigao (“calar-se”, “não falar”) (Lucas 20:26; Atos 12:17), hesuchazô (“estar quieto”) (Lucas 14:4; Atos 11:18), phimô (“calar à força, amordaçar”) (Marcos 1:25; Lucas 4:35). [W. L. Walker, Orr, 1915]